Nem áreas movimentadas escapam do processo de esvaziamento, influenciado pelo desemprego e pela alta dos aluguéis
RIO — Uma das ruas comerciais mais movimentadas do Centro do Rio na virada do século XIX, a Uruguaiana (antiga Rua da Vala) já reuniu lojas e magazines que lançavam moda, como a Casa Sloper. Em uma de suas esquinas, a Confeitaria Cavé, de 1890, é um dos últimos símbolos daquela época. Mas, hoje, quem passa pela área se depara com um cenário nada promissor: no trecho de calçada onde está a Cavé, quatro das sete lojas fecharam as portas, indicando um processo de esvaziamento que se repete em várias ruas da região.
Entre janeiro e maio deste ano, cerca de 250 estabelecimentos encerraram as atividades no Centro, segundo o Clube de Diretores Lojistas (CDL-Rio). Nas contas da Fecomércio-RJ, foram 241 baixas em 2018. Influenciado pelo crescimento do desemprego, o entorno do Largo da Carioca, analisam os especialistas, foi um dos mais afetados, por concentrar muitas empresas e sedes de estatais.
Os efeitos, contudo, são sentidos em toda parte. Na Rua Sete de Setembro, 23 lojas, 13 delas no trecho mais próximo da Praça Tiradentes, estão fechadas, com placas anunciando ofertas de aluguel ou venda. Comerciantes reclamam que as obras do VLT criaram expectativa de que a rua viraria um boulevard. Mas a região acabou deserta. Também há imóveis vazios na ruas da Assembleia, da Quitanda e do Ouvidor.
E nem mesmo a Saara escapou da crise: há vários endereços disponíveis em vias como a Buenos Aires e a Senhor dos Passos. Ali, diz Eduardo Blumberg , presidente do polo comercial, o problema não é a queda nas vendas, mas uma alta nos preços dos aluguéis.
ÍCONES AMEAÇADOS
Segundo o CDL, no Rio como um todo, 9.121 estabelecimentos fecharam no ano passado, 31,7% a mais que em 2016. Só no Centro, 1.342 lojas cerraram suas portas. Os dados de 2018 só serão divulgados no fim do ano. Segundo o CDL, porém, já se verifica aumento de 30% no número de casas fechadas na área central da cidade, que aparece no topo do ranking das regiões com mais falências.
— Esta crise é a pior dos últimos dez anos, tanto em intensidade como em duração. No Centro está pior, porque muitas empresas demitiram, estatais dispensaram terceirizados e funcionários públicos ficaram sem receber. É uma bola de neve: quanto mais desemprego, menos consumo — diz o presidente do CDL, Aldo Gonçalves.
Nesse processo de desertificação do Centro, há mais de 20 lojas desativadas em poucos mais de 200 metros do entorno da Rua da Carioca, que desde 2012 vem sofrendo com fechamento de casas. Em muitos imóveis da rua, que é protegida pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac), há placas de vendas e de aluguel. Em alguns casos, o empreendimento está à venda, mas segue aberto, sobrevivendo “no sufoco”, como a loja Violeta Vitória Som, de instrumentos musicais. Segundo os funcionários, o proprietário tenta vender o sobrado há mais de um ano.
A proprietária do tradicional Bar Luiz, fundado em 1887, também vem tentando manter a casa funcionando, apesar da queda na receita, que este ano já chega a 40% em relação a 2017. Desde que a clientela começou a sumir, o quadro de funcionários diminuiu: já foram 48, hoje são 10. E a cozinha passou a encerrar as atividades às 19h.
— Sou otimista e espero que a situação melhore— diz a empresária Rosana Santos.
Muitas marquises de lojas fechadas viraram endereço de camelôs. E, na avaliação do urbanista Luiz Fernando Janot, toda esta desordem urbana atrapalha o pedestre e ofusca a beleza do Centro.
A Secretaria Municipal de Urbanismo, por sua vez, diz que a prefeitura tem diversos incentivos ao retrofit de edificações da região, justamente com a intenção de viabilizar a reutilização de imóveis que estão desocupados e trazer mais gente para residir no Centro.